quinta-feira, 26 de março de 2009

Brando, um homem moderno

Continuando as impressões sobre Brando neste blog, inspiradas pela mostra “Brando – O Ator no Cinema”, hoje é a minha vez de escrever algumas palavras sobre o “tesouro máximo d’O Método” - como a Carol o apelidou aí embaixo. Pois bem, senhores, Carolina Pavanelli, como todos sabem, é cineasta e atriz. Já eu, além de cineasta, sou uma curiosa, aficionada pela história do cinema americano (o que a Carol também não deixa de ser), uma estudiosa do assunto, é possível dizer. O fato é que, poucos dias antes da mostra, Brando já havia cruzado o meu caminho. Zapeando os canais na TV por assinatura, encontrei, nem me lembro em qual deles, o documentário “Brando” (Mimi Freedman/Leslie Greif, Estados Unidos, 2007), quase pela metade. No mesmo dia, pude assistir, no TCM, a “Caçada Humana” (Arthur Penn, Estados Unidos, 1966) - que, infelizmente, não pôde constar no catálogo da mostra.
“O Último Tango em Paris” (1972) é, sem dúvida, um filme inesquecível. Mas é uma co-produção França/Itália dirigida por Bernardo Bertolucci, que representa um outro cinema, mais livre, além das fronteiras de Hollywood, que estava descobrindo suas regras – ou a falta delas – havia pouco tempo. Um cinema mais aberto à experimentação, a repensar a narrativa, a relação do ator com o texto e com o próprio personagem. Tratarei aqui de dois outros filmes de Brando: “Caçada Humana” e “O Pecado de Todos Nós” (John Huston, Estados Unidos, 1967), obras contemporâneas, inseridas numa já consolidada indústria de cinema americana.
Eram os anos 1960. Aos grandes estúdios de Hollywood já não era permitida a integração vertical (a possibilidade de atuar na produção, distribuição e exibição dos filmes); a TV realizava produções próprias e o público tinha entretenimento sem precisar sair de casa; o cinema se revolucionava, saía dos estúdios para as locações, rompia com a narrativa clássica que dominou a primeira década do século XX, sacudido pelos incômodos e culpas de um novo mundo, pós-Segunda Guerra.
Era imperativo que Hollywood acompanhasse as mudanças e se reestruturasse também. Não foi imediatamente, nunca houve uma quebra ampla, geral e irrestrita de padrões, mas, sim, os grandes estúdios da costa oeste, que nunca foram ingênuos, começaram a dançar conforme a música, combinando seu material de consumo ao perfil de uma nova geração. “Caçada Humana” foi um dos primeiros trabalhos de Arthur Penn no cinema, assim como de Robert Duvall e de seu xará Redford (grande sex symbol da década seguinte). No elenco, Angie Dickinson e Jane Fonda, musas de uma nova era. A história foca as frustrações, preconceitos e a ignorância da sociedade de uma típica cidadezinha americana, numa narrativa mais aberta, onde a trama não é o que mais importa.
Em “O Pecado de Todos Nós”, duas figuras icônicas da Hollywood clássica, John Huston e Elizabeth Taylor, e uma narrativa igualmente mais aberta. Com uma fotografia em sépia, onde as tonalidades do technicolor não poderiam desviar a atenção do espectador, Huston constrói relações difíceis, corajosas e sutis. Mais do que as ações, interessa aqui o comportamento dos personagens e é a atuação, mais do que o texto, que nos leva a conhecê-los.
No centro de ambos os filmes está Brando, possivelmente o maior ícone da modernidade de Hollywood. A definição do “ator”, a imagem de uma masculinidade ao mesmo tempo bruta e vulnerável, um homem com a capacidade de se transformar em qualquer homem. Brando personificou a figura do astro moderno que Hollywood precisava e reinventou o papel do ator no cinema, dando-lhe o peso criativo que tinham o diretor e o produtor. Sem a interpretação instintiva e humanizada de Brando, “Caçada Humana” e “O Pecado de Todos Nós” não teriam o ar moderno que aparentam, ainda que com os avanços narrativos.







Isabella Goulart

Nenhum comentário: